«[…] Qual deve ser o papel do português no ensino? Ampliar a sua presença como segunda Língua Estrangeira? Ser lecionada dentro das aulas da matéria troncal de galego? Ambas?
As aulas de galego devem incluir –seguindo já os programas educativos atuais– um espaço para tratar a lusofonia. No entanto, a introduçom do português no ensino é umha oportunidade: a de reforçar laços culturais e mesmo os da autoestima dos galego-falantes sumidos nos perigos do auto-ódio. Ademais, para o estudantado galego, o ensino do português é também umha porta de entrada e profissionalizaçom no mercado laboral.
As horas de docência desta matéria som, no entanto, ainda limitadas e, em consequência, a capacidade de incidência real, também é. Umha bolha necessária que precisa de umha revisom estrutural do sistema educativo no que diz respeito da aprendizage de línguas. […]»
«[…] Qual deve ser o papel do português no ensino? Ampliar a sua presença como segunda Língua Estrangeira? Ser lecionada dentros das aulas da matéria troncal de galego? Ambas? Esta pregunta é um pouco complexa porque necessita do engajamento de políticas públicas neste sentido. Em linhas gerais, eu acredito que ao falarmos do ensino de português na Galiza perpassa por reflexões sobre a necessidade de uma abordagem específica para os estudantes galegos, é necessária uma avaliação sobre as ações político-linguísticas realizadas na Galiza para o ensino do Português como segunda língua estrangeira. Talvez, o caminho a seguir seja buscar metodologias sensíveis às diferenças e semelhanças culturais e linguísticas dos estudantes de português na Galiza, verificando o repertório linguístico que nos une, bem como os diferentes valores sociais e identitários de cada um. É necessário encontrar um caminho para o desenvolvimento do ensino de português porque difere totalmente da focagem do ensino de PLE para estudantes bilíngues, ao mesmo tempo que também difere do ensino de PLE para não falantes de português. Não sei se consegui ser clara neste ponto, a questão é que, se ampliar o ensino de português como língua segunda ou focá-la dentro da matéria de galego, coincidimos em uma questão: há que procurar outras achegas para sustentar esta abordagem, levando em consideração todas as particularidades do ensino de português na Galiza. […]»
Estas semanas a generosidade duma editora galega punha nas minhas mãos outro clássico da literatura portuguesa “traduzido” para galego. Por mais que a edição fosse tão formosa como costuman ser estas coleções e que a adaptação ortográfica fosse encarregada a uma pessoa que admiro, soube imediatamente que não o leria, ainda que o livro despertasse a minha curiosidade o suficiente como para encomendar uma edição portuguesa no dia seguinte […].
Há quem diga que justamente essa é a questão: que algumas pessoas, por razões profissionais ou familiares, temos um contacto com a língua portuguesa que a maioria das pessoas não tem. Cresci numa casa com livros em português que o meu pai lia para mim pronunciando “à galega”. Interessei-me logo pelas línguas e a literatura e quando tive curiosidade por Antero de Quental, Clarice Lispector ou Saramago fiz questão de procurar os livros em português, apesar de todas as livrarias da minha cidade fazerem esforços para me vender traduções em castelhano. Talvez seja uma coisa minha, ainda que a experiência também me diga outras coisas: durante anos voltava das minhas viagens a Portugal carregado de livros infantis para as crianças dos amigos que estas devoravam sem quase notarem, no máximo perguntando por algum termo solto, mais ou menos como quando liam com ortografia galega. Sei que nos dias de hoje uma minoria de galegos e galegas continua a fazer o mesmo, oferecendo este tipo de produtos culturais às suas crianças, também com audiovisual na variante brasileira. Por outro lado, uma parte nada desprezível das editoras do país que se dedicam à língua galega publica numa ortografia convergente ou mesmo com idêntica grafia ao que conhecemos por português. Pode ser uma teima, mas também tenho a sensação, muitas vezes, de que o segredo melhor guardado da Galiza é que a imensa maioria das pessoas galego-falantes podem ler em português com um esforço mínimo. E isto é, em boa medida, independente da guerra de fundo que às vezes se manifestou vandalizando alguns livros.
Tradução e edição nas relações culturais
É certo que igual que uma língua não é só uma ferramenta de comunicação, uma tradução não serve só para fazer algo intercompreensível. Quando se traduziu o Quixote para galego foi um ato mais simbólico do que uma necessidade linguística. Muitas vezes, estas “traduções” do português cobrem um papel de aproximação entre os dois países, e às vezes mesmo estão financiadas por fundos relacionados com a integração europeia. Penso, porém, que muitos desses esforços bem intencionados teriam melhor fortuna noutra direção: uma edição adaptada para o público galego de certas obras não pasa necessariamente por uma adaptação ortográfica supérflua. A maior parte das vezes pode ser mais relevante saber o seu contexto histórico e literário, entender a sua relevância. Compreender o outro no que é diferente, não nas coisas que são praticamente iguais ou simples variantes da nossa realidade. E, obviamente, não ignorar a vantagem de que esse galego do sul devolva parte do vigor perdido ao minguado e arbitrário vocabulário que sancionam instituções como a Academia.
[Este artigo foi publicado originariamente no Nós Diario]».
«Estamos a realizar ao longo de todo o ano, umha série de entrevistas a diferentes agentes sociais para darem-nos a sua avaliaçom a respeito do processo, e também abrir possíveis novas vias de intervençom de cara o futuro. Desta volta entrevistamos iria taibo, tradutora, intérprete e ativista da Mesa.
[…] Que haveria que mudar a partir de agora para tentar minimizar e reverter a perda de falantes?
Podem fazer-se muitas coisas, mas acho que se não há um apoio muito mais claro por parte das instituições é bastante difícil que nada mude. Desde a promoção do galego nas novas plataformas onde a mocidade toda está a participar até os retrocessos que é fácil detetar em partes muito importantes da própria administração (nomeadamente, a educação e a saúde, na minha opinião), as iniciativas pessoais e privadas de todo tipo são muito positivas e imprescindíveis, mas para mim é impossível que haja mudanças reais sem essa liderança do público.
Desde a iniciativa social, continuaria com o apoio a iniciativas muito transformadoras que existem, particularmente de valorização e de divulgação de espaços de presença prática do galego.
Achas que seria possível que a nossa língua tivesse duas normas oficiais, uma similar à atual e outra ligada com as suas variedades internacionais?
Sem dúvida. A liberdade (real) de escolha é muito importante, e o sentido prático também. Daria a bem-vinda a qualquer elemento que ajude e some.»
«[…] Vendo a situaçom sociolinguística na Galiza, como imaginas o panorama dentro de 20 anos? Acho que vejo um pouco o que vemos todos: entre mal e muito mal. O número de falantes continua a descer e as medidas de protecção sobre a língua penso que são insuficientes. Faz falta uma intervenção urgente, provar coisas diferentes. Esse giro cara a norma portuguesa pode ser uma boa forma de abrir-nos a um mercado mais amplo.
O que achas que cumpre fazer para reverter a situaçom? Acho que se queremos achegar-nos aos 240 milhões de potenciais falantes, devemos apartar um pouco o debate sobre a língua e mostrar conteúdos reais (televisão, comédia, literatura…) que nos estamos perdendo por estar de costas ao mundo lusófono. Há muitas culturas maravilhosas que temos a sorte de “consumir” sem ter que estudar uma língua. É de parvos não aproveitá-la.»
«Neste ano 2021 há 40 anos que o galego passou a ser considerada língua co-oficial na Galiza, passando a ter um estatus legal que permitiria sair dos espaços informais e íntimos aos que fora relegada pola ditadura franquista. Para analisar este período, iremos realizar ao longo de todo o ano, umha série de entrevistas a diferentes agentes sociais para darem-nos a sua avaliaçom a respeito do processo, e também abrir possíveis novas vias de intervençom de cara o futuro. Desta volta entrevistamos a médica psiquiatra interessada na divulgaçom científica e na língua galega, Iria Veiga.
Qual foi a melhor iniciativa nestes quarenta anos para melhorar o status do galego? É possível que, por idade, haja muitas que nom conheça, já que fago 40 anos ao mesmo tempo que a oficialidade do galego. Das que vivim e lembro, destacaria duas. A primeira, o Xabarín Clube, graças ao qual muitas moças associamos por vez primeira o galego com o lazer, a diversom e a modernidade. A outra foi a criaçom das equipas escolares de Normalizaçom Linguística, que figérom e fam um trabalho de base espetacular, e que permitiu a muita rapazada pôr em valor o uso do galego e implicar-nos em tarefas normalizadoras.
Se pudesses recuar no tempo, que mudarias para que a situação na atualidade fosse melhor? Eu diria que formular um modelo de imersom linguística no espaço escolar desde a Escola Infantil, em lugar da atual lei que relega o galego ao estatus de língua estrangeira e cria ambientes castelhanizantes no ensino obrigatório.
Que haveria que mudar a partir de agora para tentar minimizar e reverter a perda de falantes? De novo, enquanto as políticas educativas nom apostarem formalmente na normalizaçom, será mui difícil que isto aconteça. Além disso, também seria importante criar conteúdos audiovisuais em galego e facilitar e visibilizar os que já existem em galego internacional para reverter a perda de falantes
Achas que seria possível que a nossa língua tivesse duas normas oficiais, uma similar à atual e outra ligada com as suas variedades internacionais? Si, acho perfeitamente possível e mesmo desejável. O modelo ILG nom foi capaz de deter a queda no número de falantes e, portanto, o seu principal argumento a nível prático (o maior conhecimento dos falantes pola sua proximidade com o castelhano) fica deslegitimado a este nível. A existência e difusom de duas normativas contribuiria a achegar conteúdos noutras normas e visibilizar as possibilidades comunicativas e a riqueza do galego.»
No decurso de 2020 aconteceu um debate na imprensa sobre a pertinência de o galego possuir duas normas oficiais, a local (também chamada de nacional, “oficial”, institucional, etc), estabelecida e defendida pela Real Academia Galega, e a internacional (também chamada de internacional, histórica, lusista, etc), defendida pela Associaçom Galega da Língua. O presidente da AGAL, Eduardo Maragoto, e o secretário da RAG, Henrique Monteagudo, protagonizaram um interessante intercâmbio de ideias ao respeito:
«Observamos com consternaçom o abandono do galego, o corte na transmissom intergeracional que se vai mostrando cada vez maior, inquérito após inquérito. E a causa principal para pais e maes preferirem as crianças falando castelhano em vez de galego é, estudos apontam, terem a percepçom de ser impossível “ganhar a vida” com a nossa língua.
E com certeza, nom se negará, ganhar a vida num emprego, com produçom primária, com um negócio, como quer que seja… é tarefa quase impossível na nossa língua. O nosso espaço económico está marcado num quadro definido polo Estado, que estabelece umha “unidade económica” ou “unidade de mercado” cuja língua oficial de relacionamento é, tem que ser, o “castelhano ou espanhol”. É aplicada com firmeza como veículo de comunicaçom para trânsito e relações comerciais, laborais, administrativas, legais, empresariais, profissionais… […]»
«[…] Se pudesses recuar no tempo, que mudarias para que a situaçom na atualidade fosse melhor?
lindeiros.gal
Quiçá houvo um excesso de autoconfiança, no sentido de que a grande base social com que contava o galego, com percentagens de falantes ainda hoje chamativas para umha língua minoritária de Europa, nos fijo minimizar até há relativamente pouco tempo o problema da ruptura da transmissom familiar e do uso do galego entre as novas geraçons. Ainda assim, essa ruptura da transmissom ralentizou-se com a chegada da democracia, porque se incides no prestigio da língua e na sua utilidade social e económica, reduzes as razons que podem ter os pais e nais para abandonar o galego na educaçom dos filhos. Em todo caso, é um âmbito em que se pudo incidir mais, vista a profunda transformaçom que estava a experimentar Galiza, com o crescimento das cidades e a perda de peso do sector primário, duas mudanças que minarom o ecossistema privilegiado que o galego tinha, e ainda tem, no mundo rural. […]
Que haveria que mudar a partir de agora para tentar minimizar e reverter a perda de falantes? Há um âmbito mui importante, que é o da empresa, onde estamos a tentar atuar desde que aprovamos o Plano de dinamizaçom do galego no tecido económico. A vigência do plano acaba neste 2020, e cuido que deu os seus frutos, mas nós continuaremos a trabalhar, porque é fundamental que o galego se veja como um idioma útil no mundo laboral para que as famílias e a gente nova se decidam a empregá-lo. Também é importante continuar a trabalhar para que as tecnologias da informaçom e da comunicaçom se desenvolvam na língua própria da Galiza e, em geral, cuido que há que prestarlhe umha especial atençom à cultura juvenil, tal e como se propom no nosso Plano de dinamizaçom da língua galega na mocidade 2019-2022. Outro espaço onde eu gostaria de avançar mais, algo para o que devemos contar com o apoio do governo de Espanha, porque depende em boa medida del, é o da justiça. Nom é que aqui nom houvesse avanços, mas cuido que todos gostaríamos de que ainda fossem mais.
Achas que seria possível que a nossa língua tivesse duas normas oficiais, umha similar à atual e outra ligada com as suas variedades internacionais? A Junta de Galiza vai aceitar a decissom que, em matéria de normativa, adote a Real Academia Galega, que é quem tem atribuída esta competência. Se a Real Academia Galega o vê factível, a Junta também; se nom o vê viável e só há umha norma oficial, esta será a que use a Junta.»
«Na passada quinta-feira 12 de novembro foi apresentado no Teatro Colón da Corunha o projeto audiovisual da AGAL “De Carballo a Carvalho. Percurso pola vida e obra de Carvalho Calero”. No colóquio posterior, aberto a muito pouco público com convite devido à emergência sanitária que padecemos, participaram Aser Álvarez, realizador e roteirista, e Pilar García Negro, entrevistada no documentário, para além do presidente da AGAL, Eduardo Maragoto, que se mostrou muito satisfeito polo desempenho da equipa realizadora, pois conseguiu “condensar a vida e o ideário de Carvalho sem perder de vista o objetivo didático e o público juvenil que pretendia atingir”. O presidente da AGAL lembrou algumhas passagens corunhesas da vida juvenil de Carvalho, informaçom que Garcia Negro completou no colóquio lembrando a intensa atividade de conferencista de Carvalho na cidade das Marinhas nos últimos anos da dua vida. A política corunhesa salientou, por outro lado, a pertença de Carvalho à geraçom de “nativos nacionalistas, em feliz expressom de Justo Beramendi” que levantou imensos projetos imprescindíveis para a língua e cultura do país. […]»